segunda-feira, 13 de junho de 2011

O demônio do meio-dia

Finalmente terminei de escrever meu novo romance "Longe de Tudo e de todos".Passei os últimos 45 dias grudada na cadeira. O livro ficou enorme -280 páginas - mas gostei muito do resultado final. Agora é torcer os dedos. E como estou literalmente de ressaca, resolvi postar uma crônica antiga. De uma outra época, mas que gosto muito.
Fica a dica do livro "O demônio do meio-dia - uma anatomia da depressão".O livro é simplesmente imperdível.

O demônio do meio-dia

Dias atrás uma amiga me disse que a grande maioria das mulheres é neurótica, estressada e pirada. Fiquei chocada com a afirmação. Mas ficou um ponto de interrogação. Pensei em como ando com meus humores. Nem bem eu sei como estarei amanhã, hoje à noite , que dirá, daqui a uma hora.
Logo eu que nunca fui uma pessoa instável. Muito pelo contrário. Os que me conhecem me imaginam centrada e equilibrada. Uma fortaleza!! Também sempre me vi e me senti assim.
Até que entrei num turbilhão de mudanças, e meu equilíbrio foi para o espaço. Acho que posso compará-lo hoje a alguém andando numa montanha russa, fazendo um looping completo. Devo estar naquela parte lá no alto, com meu carrinho de cabeça para baixo. É como tenho me sentido.
Assim como o clima está todo alterado, com quatro estações no mesmo dia, também tenho sentido enormes variações e flutuações no meu humor: será culpa dos hormônios, da idade, das mudanças?
Sinceramente, não sei.
Mas a sensação é a mesma de estar de cabeça para baixo, e a toda velocidade numa montanha russa.
Anos atrás, li o excelente livro sobre depressão, escrito pelo jornalista Andrew Solomon. Ele compara a depressão a um demônio que se apossa do corpo. Ele mesmo um depressivo maior. O livro não é científico, mas com certeza é um dos melhores textos sobre depressão que já li. Redigido com clareza, conhecimento e principalmente, com sentimento. Seu nome é “O demônio do meio-dia – uma anatomia da depressão”.
Muito se fala sobre a necessidade de mudanças na vida das pessoas. O quanto o novo e o desconhecido rejuvenescem e energizam, tornando as pessoas melhores, mais maduras, experientes, dinâmicas e modernas.
Parece que a monotonia e a rotina do conhecido saiu de moda. Mas pouco se fala das dificuldades que acompanham as tais mudanças.
Porque mudar pode ser necessário. Fácil, nem sempre. Às vezes, pode ser.
Poucos falam da ansiedade e da angústia que tiram o sono e o apetite. Poucos falam dos momentos de desolação e saudade que invariavelmente nos fazem repensar nossas escolhas. Da tristeza e depressão que muitas vezes se tornam nossas companhias diárias, principalmente naqueles momentos em que nada do que foi planejado parece dar certo. Não que tristeza e depressão sejam a mesma coisa. Se misturam e se apresentam mesmo sem ser convidadas. Da saudade dos que deixamos para trás, ou que nos deixaram. Pessoas, rotinas, momentos únicos deixados no passado. No antes. Antes da mudança. Sim, porque quando realmente efetuamos mudanças substanciais em nossas vidas costumamos lembrar do antes e do depois. E é no antes que estão as coisas conhecidas. Até mesmo nossos antigos infernos tornam-se floridos e coloridos neste momento da cadeirinha virada para baixo na montanha-russa.
Quantos nos arrependemos e pensamos como fazer para retroceder a fita. Para o antes. Às vezes é possível, mas nem sempre é.
Acredito nunca ser possível.
Quando retrocedermos a fita, não seremos mais os mesmos. (Não seríamos mesmo que não tivéssemos feito nada). Não tem como não nos lembrarmos da sensação de estar de cabeça para baixo na montanha-russa. Não tem como apagar as noites mal dormidas, os momentos de angústia e ansiedade. Nem da saudade que dói e corrói a alma. Nem do sofrimento, do medo e da insegurança.
Estes também são demônios que podem se apossar de nós em momentos de crise. Durante o antes e o depois da mudança. É quando nossas certezas são testadas. Nossa perseverança e persistência colocadas em xeque.
Se permitirmos seremos engolidos e dominados por esses demônios.
Já dizia Jung algo como “não temos problemas, os problemas é que nos tem”. Ou seja, podemos ficar aprisionados, limitados e paralisados frente aos diversos demônios que surgem durante o processo de mudança. Porque eles nos governam quando deixamos, principalmente quando estamos na cadeira virada para baixo na montanha-russa.
O jeito é agüentar o tranco que logo logo, a cadeira volta ao seu lugar, segue nos trilhos com novas emoções e sensações, e enfim, chegamos numa nova parada.
Podemos retroceder? Sim.
Com a certeza de que alguma mudança aconteceu.
Quanto a afirmação da minha amiga?
Discordo categoricamente.
Talvez a grande maioria das mulheres tenha apenas fases neuróticas, piradas e estressadas. Elas “estão” e não “são” desse jeito.
Como qualquer simples mortal!
São Paulo, outubro de 2007.

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